Por Ricardo Wagner –
Comunicador popular pela Obas
Comissões municipais do FCSVJ e estudantes da UECE |
“Novas vidas, vidas novas”. Com essa frase, dona Santa – agricultora, facilitadora de formações como o GAPA e GRH – iniciou o debate sobre convivência com o semiárido e
suas tecnologias sociais, realizado durante a VIII Semana Zé Maria do Tomé, no
STTR de Limoeiro do Norte.
A mesa foi composta por dona Santa, José Augusto (agricultor –
Quixeré), Sr. Aldenor (STTR Russas), prof. Paulo (IFCE), Angerliana (Cáritas
Limoeiro) e facilitada por Diego Gadelha (Cáritas Limoeiro). Participaram as
comissões municipais do Vale do Jaguaribe, professoras/es, estudantes da UECE Campus
Itaperi, organizações sociais e pessoas da comunidade.
“O P1+2 tem enveredado por caminhos de evolução”
Dona Santa lembra que as tecnologias sociais contribuem para
a organização das famílias e para a compreensão de que foram conquistas
históricas. “Além da água de qualidade pra beber, o P1+2 tem despertado nas
famílias o interesse em variar a produção. Antes, as mulheres criavam mais
galinhas para produzir ovos caipiras, mas tem aumentado a produção
agropecuária, que envolve cabras e outros pequenos animais. E sem falar que as
cisternas valorizam as suas propriedades e estimula as famílias a buscar outras
tecnologias como o biogás, energia solar e água de reuso”.
Augusto (agricultor de Quixeré) apresenta maquete do Bioágua |
José Augusto, agricultor da comunidade Lagoinha, em Quixeré,
exibiu orgulhosamente uma maquete do projeto bioágua familiar, que também é
conhecido por água de reuso ou águas cinzas. A curiosidade, principalmente
dos/as estudantes da UECE foi grande, formando um aglomerado durante a sua
explicação. “Esse projeto, além de reaproveitar a água, facilita a vida da
gente porque a gente tem como irrigar e nem se vê mais esgoto a céu aberto”,
disse o agricultor. Ele lamenta que essa tecnologia ainda é pouco divulgada e
recebe pouco investimento, com custo estimado em 3 mil reais. Augusto está
muito feliz porque conseguiu produzir 100 quilos de húmus sem agrotóxicos, além
de conseguir irrigar sua propriedade reaproveitando a água que antes o destino
era o esgoto.
Armazenamento + gerenciamento da água = Bem viver
Seu Aldenor (STTR Russas) tem sempre um jeito de nos fazer
refletir sobre a importância das tecnologias sociais. “Se a gente for somar os
52 mil litros de água armazenada em cada cisterna dessas, equivale a muitos
açudes. E a diferença é que essa água está ali, na porta de casa, servindo as
famílias”. Ele contou também que com as cisternas percebeu que o tratamento
sobre as questões do semiárido vem sendo valorizado, mudando a mentalidade das
pessoas.
“A gente não quer só sobrevivência: a gente quer prosperidade
e autonomia”
Assim o professor Paulo (IFCE) pontuou sobre as lutas que
envolvem a questão hídrica, especialmente no Vale do Jaguaribe. Ele instigou o
pensar nas lutas pelo acesso à água, direito à terra e as noções de aprendizado
a partir das dificuldades que os povos da região passam. “O que aprendemos com
isso? As limitações naturais (estiagem) não podem implicar no não
desenvolvimento”. Paulo discorreu sobre como aproveitar e entender a região,
refletindo sobre os modelos de desenvolvimento que, segundo ele, não são
adequados a realidade local. “O período de poucas chuvas é sempre período de
grande preocupação. Até que ponto essas grandes obras chegam aos pequenos
produtores, que estão dispersos? Estamos no nível de sobrevivência, mas desde
quando deixamos de produzir no campo?” Provocou o professor. Ele também lembrou
que os canais de integração são vistos como veia principal, deixando os rios em
segundo plano, e que as tecnologias sociais surgem como a outra ponta que
mostra que somos capazes de administrar os recursos hídricos.
“Nós temos força e sabemos os caminhos”
Angerliana (Cáritas Limoeiro) apresenta gráfico resgatando histórico das tecnologias sociais |
Seguindo a linha dos avanços acontecidos no semiárido a
partir das tecnologias sociais, Angerliana (Cáritas Limoeiro) trouxe uma
questão: “Qual o potencial político das tecnologias sociais?!” Entre afirmação
e indagação, ela sugeriu algumas reflexões sobre o nosso papel individual e
institucional. “É preciso avaliar nossas metodologias. Quantas famílias
entendem que as tecnologias sociais são potenciais para mobilização e garantia
de direitos sociais?”
“Um arsenal de resistência fica restrito às comunidades”
Diego Gadelha (Cáritas) pontuou que em um ano o agronegócio
utilizou a água do aqüífero Jandaíra Açu o equivalente a um milhão de
cisternas, com a produção de melão para a exportação. “E em 7 anos de seca a
carcinicultura (produção de camarão) vem aumentado. É da gente se perguntar:
pra quem tá faltando água? É preciso que a resistência vire mobilização
política”, provocou.
Durante o debate, muitas questões pertinentes surgiram como o
retorno das discussões sobre conjuntura política nas bases, debates sobre as
tecnologias com metodologias apropriadas às faixas etárias nas escolas,
reafirmar e promover o autoconhecimento dos valores e conquistas dos povos
tradicionais e também compreender a importância de se debater a comunicação
popular como estratégia de fortalecimento das lutas do semiárido.
Jorge Pinto (Obas) debatendo sobre conjuntura política |
“A resistência dos trabalhadores e trabalhadoras é a
esperança”
Continuando a nossa roda de conversa, foi a vez de Jorge
Pinto (Obas) trazer elementos que dialogassem que a atual conjuntura política
que o Brasil atravessa. Após um pequeno vídeo, Jorge, elencou algumas perguntas
para que as comissões municipais pudessem refletir e posicionar-se, como “o
colapso do pacto social”, “transformações reacionárias no regime político” e “neofascismo
mostra as garras”.
Dona Socorro (Comissão Municipal de Russas) |
O debate foi emocionante e fervoroso, ao lembrarmos os
discursos reacionários e imediatistas, favoráveis a subtração de direitos como
a reforma trabalhista e previdenciária e com a conivência das grandes mídias. Dona Socorro, por exemplo, nos perguntou "que democracia é essa que estamos vivendo? É justo nos retirar tantos direitos conquistados com tanta luta simplesmente pra satisfazer a quem tem poder?"
A
Constituição Federal foi citada como uma fonte desrespeitada de direitos,
provocada pela ganância pelo poder, que insufla discursos de ódio contra
minorias e dissemina preconceitos contra negras e negros, LGBTT’s, pessoas da
periferia, mulheres, nordestinas/os entre outros.
Daí encaminhou-se um novo momento para elaboração coletiva de
metodologias e planos de ação que nos reascenda o brilho do entendimento do que
é o bem viver no semiárido.
Você sabia?
FCSVJ - Forum de Convivência com o Semiárido do Vale do Jaguaribe. é composto pelas comissões municipais do Vale do Jaguaribe. Integram o fórum os Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, agricultoras/es, organizações não governamentais, profissionais da saúde e da educação, lideranças religiosas, pastorais sociais, associações comunitárias e juventude rural.
GRH - Curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos
GAPA - Curso de Gestão de Água para Produção de Alimentos
FCSVJ - Forum de Convivência com o Semiárido do Vale do Jaguaribe. é composto pelas comissões municipais do Vale do Jaguaribe. Integram o fórum os Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, agricultoras/es, organizações não governamentais, profissionais da saúde e da educação, lideranças religiosas, pastorais sociais, associações comunitárias e juventude rural.
GRH - Curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos
GAPA - Curso de Gestão de Água para Produção de Alimentos
São doze comitês de bacias hidrográficas no Ceará
80% das decisões devem ser tomadas pela sociedade civil e 20%
pelo poder público.
22% da água vai para a indústria
0,25% é o investimento do Governo Federal na agricultura
familiar este ano
Houve um corte de 92% nos programas de cisternas pelo Governo
Federal
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