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sexta-feira, 21 de março de 2025
Águas e
Mudanças climáticas: como isso nos afeta.
Matheus Lima – Eng.
Agrônomo, Mestre em Agronomia e Técnico de Campo da Obas
Ricardo Wagner –
Comunicador Popular pela Obas
Faz tempo que se fala em mudanças
climáticas e isso sempre pareceu algo que demoraria a acontecer. O fato é que
essas mudanças já começaram. E vem afetando todo o planeta. Todo mundo vai
sentir os impactos de uma forma ou de outra. A maioria da população terá
dificuldades de acesso à água bem mais rápido e também de forma mais brutal. Segundo
a ONU – Organização das Nações Unidas, as causas são diversas. Por exemplo, para
se produzir cimento, ferro, aço, plástico, confecções, produtos eletrônicos
entre outros materiais, muitas indústrias usam equipamentos movidos a carvão,
petróleo ou gás, liberando fumaças e gases como o dióxido de carbono e o óxido
nitroso. Esses gases ficam na atmosfera, retendo o calor do sol e vai aquecendo
a Terra. Isso a gente chama de Efeito Estufa.
Mas há outros fatores que
potencializam as mudanças climáticas. Vamos conhecer alguns.
Transporte - Os
combustíveis fósseis estão nos carros, aviões, caminhões e navios, emitindo
quase um quarto de dióxido de carbono. E como a gasolina vem do petróleo, os
veículos são a maior parte dessa emissão.
Desmatamento - Nossas
florestas estão dando lugar a fazendas e pastos. Quando as árvores são
cortadas, elas liberam o carbono que estavam armazenando direto para a
atmosfera. São mais de 12 milhões de hectares de florestas destruídos por ano
no mundo! O avanço do agronegócio sobre áreas de floresta nativa e outros
biomas tem causado o desmatamento, a perda de biodiversidade e a extinção de
espécies.
Secas e enchentes: tudo ao
mesmo tempo agora! Com o aumento das temperaturas, o acesso à água torna-se
menor. A escassez de água em algumas regiões e as enchentes em outras, mostram
o desequilíbrio ambiental que nosso ecossistema vem passando. A seca na
Amazônia é um grande exemplo disso. Quem imaginaria que aquela imensidão de rio
pudesse passar por uma situação dessas?
Desde os anos 1980 que a
temperatura vem aumentando a cada ano. De 2011 aos dias de hoje, foram os anos
mais quentes já registrados. O calor dificulta os trabalhos ao ar livre de
agricultores e agricultoras, pedreiros/as, pescadores/as, entre tantos outros.
Queimadas e incêndios têm se espalhado mais rápido e além dos prejuízos com
plantações, florestas e casas, as pessoas adoecem por conta da fumaça e muitas
perdem a vida. A falta de mata ciliar, causa assoreamento dos rios. Muitos
ficam secos por anos seguidos. A escassez de água afeta tanto a agricultura
quanto as pessoas. De 2010 a 2019, cerca de 23 milhões de pessoas do mundo todo
abandonaram suas casas por causa da falta d’água. Isso gera impactos enormes,
evidenciando o grande número de refugiados em países onde as pessoas estão mais
vulneráveis e aumentando a pobreza pelo mundo. Os períodos de seca e de
desertificação vem aumentando e as áreas de cultivo diminuindo. As queimadas e
a desertificação têm expulsado animais de seus territórios, causando desequilíbrio,
pela falta de predadores naturais e muitas vezes transmitindo doenças até então
desconhecidas. O que se sabe é que as mudanças climáticas ameaçam a
sobrevivência de todos os seres vivos do planeta! Na próxima década, mais de um
milhão de espécies correm o risco de sumir do mapa.
Enquanto isso, a fome e a
subnutrição vêm aumentando em lugares onde as pessoas não conseguem produzir
seus alimentos, afetando a cada ano cerca de 13 milhões de pessoas.
E nossas águas? As
tempestades têm sido comuns em lugares onde nunca existiam. Os furacões e
tufões se fortalecem com o aquecimento dos oceanos, destruindo tudo o que veem
pela frente. O derretimento das geleiras e o lixo, óleos e produtos químicos
que vão para os mares tem deixado as águas mais ácidas, aumentando o risco de
espécies marítimas desaparecerem, afetando a alimentação de milhões de pessoas.
E pra completar, o agronegócio
utiliza muita água para irrigação, contribuindo para a crise hídrica em
diversas regiões do planeta, especialmente no Semiárido.
O clima afeta diretamente as
populações mais pobres, principalmente nas periferias, favelas, comunidades
rurais e em lugares onde não tem saneamento básico. Basta observar quando
acontecem as enchentes e alagamentos, destruindo casas, lavouras, represas e
outras estruturas.
Todas essas questões aliadas à
maneira excessiva que consumimos, como nos locomovemos, como nos alimentamos e
quanto lixo produzimos, contribuem para os gases emitidos para o efeito estufa.
Será que precisamos mesmo de uma roupa nova a cada semana, utilizar tanta
sacola plástica, trocar nossos celulares por um modelo novo a cada ano? O nosso
modo de viver atua diretamente em todas essas questões, sendo que as pessoas
mais ricas são responsáveis por mais emissões de gases do efeito estufa do que
os 50% das pessoas mais pobres.
O Agro não é pop - A
produção de alimentos é tema central no
debate sobre o futuro do planeta. O agronegócio e sua produção em larga escala
de monoculturas de milho e soja, tem sido apontado como um dos principais
responsáveis pela crise climática e tem relação direta com o aumento da fome e
da subnutrição, que chamamos de insegurança alimentar. Esse tipo de agricultura
responde por um quarto das emissões globais de gases como o metano e o dióxido
de carbono, através do desmatamento, queimadas, uso de agrotóxicos e fertilizantes
nitrogenados. O uso intensivo de agrotóxicos na produção de alimentos causa a
contaminação do solo, da água, dos alimentos e do ar, com graves consequências
para a saúde humana e para o meio ambiente. Além disso, o agronegócio gera
grande desperdício de alimentos seja por perdas na colheita, no transporte ou
no consumo.
Mas existe a Agricultura
Familiar, que envereda por outros caminhos. É importante afirmar que a
Agricultura Familiar é responsável por alimentar 80% da população mundial! Esse
modelo de produção de alimentos é uma alternativa sustentável e socialmente
justa, pois respeita e valoriza os ciclos da produção, os cultivos locais, a
não utilização de agrotóxicos, as diferentes espécies de plantas e animais,
contribuindo para a segurança alimentar e nutricional das famílias e
comunidades. Práticas agrícolas adaptadas às condições de cada região, e o
manejo integrado de pragas, contribuem para a preservação do solo, da água e da
biodiversidade. Os conhecimentos
tradicionais e a cultura local também são muito valorizados, transmitidos de
geração em geração. Desse modo, a agricultura familiar gera emprego e renda,
visibiliza e valoriza o trabalho das mulheres, e promove a permanência de
agricultoras e agricultores no campo para o desenvolvimento das comunidades. A
essas práticas chamamos de Agroecologia.
Entre os desafios, estão o acesso
a crédito, assistência técnica e mercados, além da pressão do agronegócio, que
busca monopolizar a produção de alimentos. Para garantir a segurança alimentar
e nutricional da população e proteger o meio ambiente, é fundamental fortalecer
a agricultura familiar, por meio de políticas públicas que incentivem a
produção sustentável, a Agroecologia, a criação de cooperativas e associações
de produtores, a assistência técnica e a abertura de mercados para os produtos
da agricultura familiar.
A sociedade precisa escolher
entre o agronegócio, que concentra a produção de alimentos nas mãos de grandes
empresas e causa graves impactos socioambientais, e a Agricultura Familiar, que
valoriza a diversidade, a sustentabilidade e a justiça social.
É preciso ouvir a ciência, os
saberes populares, os povos originários e rever nossos modos de conviver com a
natureza. Programas sociais como as cisternas de placas (de água para beber,
produzir alimentos e para escolas), casas de sementes e transição agroecológica
são comprovadamente soluções de convivência com o semiárido. Mas elas sozinhas
podem ser engolidas ou fragilizadas pela ganância que alimenta o capitalismo e
o agronegócio. Os povos do campo, das florestas, das águas e das cidades
precisam unir forças para confrontar o modelo destruidor de vidas. De que lado
você está?